sábado, 22 de dezembro de 2012

Depois do fim do mundo




Levantei com o despertador esgoelando nos meus ouvidos. Eram 10 horas e eu com reunião marcada por volta das 11. Estava meio tonta ainda, pisando alto. Tomei um banho tipo lava a jato. Engoli o café sem açúcar me perguntando como tinha encontrado o pó e o coador naquela bagunça de cozinha. Caminhei até a sala para pegar a chave do carro que sempre fica em cima da mesinha de canto. Quase queimei minha língua com o café tamanho o susto ao me deparar com aquele cômodo. Percebi que não estava em casa. Tinha feito café na cozinha de alguém e estava no apartamento de sabe lá de quem. Era o fim! Nunca antes em toda minha média vida tinha acontecido um negócio daquele. Mas como isso sucedeu? Não me lembrar de nada? Tudo muito estranho.

Andando mais um pouco na sala, que era daquelas de capa de revista de arquitetura, bonita pra chuchu, senti um odor estranho. Puta merda! Cheiro de enxofre! Quase morri sufocada. Coisa escalafobética. Fiquei nervosa, mas tentei raciocinar. Bom, se eu não estava na minha casa, precisava descobrir como fui parar naquele lugar. De repente, uma pontada na cabeça. Que dor horrível! Levei a mão no alto da cabeça e percebi uma montanha. Corri para olhar no espelho e vi aquela coisa imensa entre meus cabelos. Uma só não. Duas coisas, ou melhor, galos. Era o fim!

Já estava no auge da minha preocupação. Decidida a pegar o telefone e chamar a polícia. Dizer que sofri um sequestro relâmpago e estava com muito medo de sair sozinha daquela casa. Sei lá, alguma coisa que trouxesse um ar de responsabilidade àquela situação tão pouco sem juízo. Mas o pior ainda estava por vir. Avistei no final do corredor uma porta. Fechada! Sinal que alguém ainda dormia. Ai minha nossa senhora! Era a hora da revelação. Caminhei sorrateiramente até a porta. Abri bem devagar tentando fazer barulho quase zero. Pronto! Agora tinha ferrado tudo.

Todo aquele cheiro de enxofre tinha fundamento. Era o capeta em pessoa que morava ali. A euforia de aproveitar tudo num mesmo dia em função do fim do mundo tinha dado resultado rápido. Mal havia acabado a festa e eu tinha parado no inferno! Junto do bicho feio, do cambito, pé-preto,  maioral, demo, ai minha santinha junto do excomungado. Olha lá! Aquilo era um chifre. Não aguentava olhar, precisava de uma coberta para enfiar debaixo. Que vontade de chorar. Pra que pecar tanto num dia só? E o mundo, aquela bosta, tinha ou não acabado? Resolvi encarar o bicho. Parti pra cima dele com unhas e dentes. Vamos enfrentar os medos. Tá no inferno abraça logo! E fui.

Quase matei Dona Jandira! Era minha vizinha na cama. Ela tinha aproveitado a onda de fim do mundo e foi brincar com o marido daquelas fantasias de sex shopping. A maldita já é maltratada e ainda me coloca uma fantasia de capeta. Maldição! A bicha tinha conseguido piorar a situação. Quase matei a mulher! Pedi mil desculpas. Expliquei que tinha acabado de acordar e não estava entendendo nada. Aí ela me disse que eu cheguei tão bêbada que entrei na porta errada, pois ficava destrancada. Como eu já estava no quarto feito uma morta estatelada na cama da filha da Dona Jandira, a pobre senhora resolveu me deixar dormir o sonho dos anjos. Só se esqueceu de me avisar que acordaria com o capeta! Tadinha da Dona Jandira. Eu a chamando de demo, enquanto salvou minha vida. Logo naquele dia que o mundo ia acabar em barranco!
Suspirei aliviada de tudo. Enfim não tinha feito tanta bobagem (ou não) quanto pensava. Tudo mais esclarecido. Apenas um pilequinho para comemorar o fim do mundo. Fui saindo devagarinho, com sorriso amarelo, pedindo licença para a mulher ainda sonolenta. “Boa tarde pra senhora, Dona Jandira. Ah Feliz Natal adiantado!”

Era melhor tratar de trabalhar. E bem. Porque outra notícia sobre fim do mundo só acredito quando os astrônomos confirmarem de verdade. Esse negócio de acreditar em astrologia em si pode até funcionar, comigo é que foi péssimo. De-fi-ni-ti-va-men-te! 

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Asas da liberdade

Olhou para o outro lado da rua. Uma indecisão lhe tomava o corpo. Era como se estivesse congelado, preso naquele lado da rua. As pessoas trombavam em seu braço, em suas pernas. Sentia que incomodava o mundo. Não sou bem aceita aqui, pensou Nora. Estava difícil acreditar que ela fazia alguma diferença na vida das pessoas. Todo modo que agia incomodava alguém de certa forma. Começou a lembrar de cada um de seus amigos e familiares e das opiniões a seu respeito.

- Nora, você precisa melhorar esse cabelo, minha filha. Tem que passar uma tinta aí. E se for passar, vê se escolhe o vermelho escuro, combina mais com você.

- Nora, querida, eu estou te achando triste. Está muito tempo em casa. Precisa se abrir mais para os amigos. Você anda muito distante.

- Puta merda! Essa é você mesma? Se eu fosse você procurava um daqueles médicos porretas e fazia uma lipo. Sua barriga está estranha, Nora. Só estou te falando isso porque sou sua amiga. Alta autoestima é tudo!

- Lindinha, quantas vezes já lhe disse que precisa arrumar um emprego fixo, com carteira assinada, de preferência na sua área. Tenho um monte de lugar que posso lhe indicar. Estão precisando de gente. Você também nem se mexe!

- Nora, eu se fosse você procurava qualquer emprego, o importante é estar no mercado! Você não pode acordar tão tarde. A vida começa cedo, menina.

- Eita, tá precisando dá um tapa no visual. Comprar roupas de marca para impressionar, andar mais em shoppings, ir às baladas. Tá ficando muito velha com este estilo que anda por aí.

- Já casou Nora? Uai precisa casar menina! Tá passando da idade de ter filhos. Ou você prefere ficar pra titia. Ficar para solteirona é muito triste, você vai morrer sozinha, sem ninguém!

- Nora, já sei! Pinta o cabelo de loiro. Os homens gostam é disso. Mulher com peitos à mostra, bunda empinada e cabelo loiro. É super sensual!

- Sei não viu. Você precisa é de uma psicóloga, fazer terapia, essas coisas de gente com problema demais.

- Nora não gasta tanto dinheiro com sua casa. Vai viajar. Quem sabe no caminho você arruma um namorado. Você tá muito sozinha.

- Nora precisa é ter Deus no coração. Só isso que precisa, mais nada!

Era como se as pessoas estivessem ali do seu lado falando, falando e falando. Enquanto isso seus músculos pareciam enrijecer mais. Nora não conseguia atravessar a rua. O sinal para pedestres já tinha aberto pelo menos umas cinquenta vezes, desde que começara a tentar contar. Ela não entendia a reação do seu corpo. Tudo bem que aquelas cobranças diárias sobre o que devia ou não fazer da sua vida eram comuns. Ela acreditava que havia aceitado todas. Tinha para si que precisava mesmo mudar.

De repente Nora teve outro pensamento. Para que deveria mudar? Quando começou a agir como ela acreditava ser o certo, sentiu uma sensação de liberdade. Tomava decisões sem muita preocupação. Não tinha uma pedra na garganta, a cabeça quase não doía. Estava feliz daquele jeito, apenas queria um pouco do carinho dos amigos. O problema era que eles não entendiam o seu comportamento e por isso às vezes se afastavam.  

Mas agora batia uma indecisão. Continuava ela mesma ou seguia os conselhos e mudava? Cada vez que pensava, mais travava suas pernas. Quem sabe era melhor parar de pensar. Respirar fundo, tentar concentrar na luz verde do sinal e vagarosamente se arrastar até o outro lado da rua. Sua casa estava logo ali na esquina. Seu estômago roncava de fome. Tentou novamente sair e nada. Tudo pesado ainda. Começou a chorar. As lágrimas desciam feito cachoeira pelo rosto. Não podia conter os soluços. Até que um senhor já de meia idade parou impressionado com a situação.


-Minha filha será que posso lhe ajudar de alguma forma? Estou vendo que está chorando muito.

- Preciso seu moço atravessar a rua e não consigo andar. Só isso. Minha casa fica do outro lado.

- Então segura no meu braço que te ajudo se for esse o problema. Vamos devagar, mas conseguimos.

Os dois atravessaram a rua. Já do outro lado Nora sentiu menos peso. Não entendia o motivo. Mas a angústia tinha acabado. Agradeceu ao senhor que logo sumiu dobrando a esquina. Subiu para seu apartamento. Já não sentia fome, apenas uma leveza incomum. Nora agora observava de sua janela as duas esquinas. Procurava entender como os sentimentos tinham mudado de um lado para o outro. Era tarde e estava sem sono. Ficou a noite toda olhando. Engraçado como tudo parecia muito simples.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Uma vida cheia de fantasmas



Todos os dias eles estão na minha casa. Entram e saem na verdade. Beijam às vezes meu rosto. Tomam café comigo. Quando assusto estão no quintal, colhendo goiabas, fazendo tachadas de doces. Brindam em nossas festas, sentam ao nosso lado, ouvem histórias e riem junto com a gente. Até mesmo de seus deslizes, erros, exageros.  Há dias em que voltam a ser crianças levadas da breca. Chutando a canela dos adultos, matando formigas pra fazer experiência, e querendo a atenção de quem estiver por perto. Em outro tempo já se apresentam como adultos debochados e cheios de manias.  Mas são nos dias de seus aniversários e nos feriados que passam mais tempo com a gente. Já começam cedo a lavar a área da churrasqueira, arrumar a casa, mexer a comida e até a arriscar palpites. “Se fosse eu colocaria mais pimenta, menos sal, deixava a massa mais tempo descansando”.

Debochados, bravos, sinceros, chatos e de um amor sem tamanho. São assim nossos fantasmas. Estão sempre com a gente. Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, na pobreza e na riqueza. Amém. Qual o motivo então de existir um dia para nos forçar a ser tristes? A reconstruir na memória todos os trajetos de certos dias fatídicos? Se a razão for ter um momento pra rezar, orar, meditar, pedir, energizar por eles, que sejam todos os dias. Que sejam incluídos em nossas vidas. Na verdade eles estão. Tudo é rito mesmo. Importante pra uns, sem motivo pra outros.

Bobagem pra mim. Os meus fantasmas já comem da minha comida diariamente. Eles estão aqui e ali, em cada pensamento, ato e palavras soltas. Durante todos os dias da minha vida até que a morte nos separe (ou, segundo alguns que dizem saber, nos encontre).

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Universo Paralelo


Parte 1
A missionária

Saiu de casa cedo. Como sempre, antes de ir, deixava o café pronto para os filhos, o pão novinho e as xícaras de cada um sobre a mesa. Eram três. Não tinha marido. Ficara viúva muito nova e decidiu não se casar mais. Sentia falta de um companheiro, mas alegava que isso tomaria muito do seu tempo.

- Tenho tanta coisa pra fazer. Não posso pensar em me relacionar com alguém. Só vou dedicar aos meus filhos. Justificava-se para os amigos que a importunavam sempre com a intenção de apresenta-la a mais um pretendente.

A rotina de Elza era sempre a mesma. Café, acordar os filhos, faxina na casa da Dona Mercês, vendinha do bairro, preparar a janta que daria para o almoço do dia seguinte. Sair nem pensar. Conversar com as vizinhas muito menos.

Por anos viveu assim. Sozinha, sem muitos amigos. Só mesmo a Josefa e o Luiz que continuavam insistindo em visita-la. Mas se dependesse da boa vontade dela, não veria mais ninguém.

Os filhos já estavam grandes e ela percebia que a cada dia mais perdia o fio da comunicação com eles. A convivência se resumia em quase meia dúzia de palavras por dia. Sentia um vazio tremendo. Uma falta de sentido em sua vida. Tudo era uma mistura de desânimo com obrigações rotineiras. Tentava se apegar às ocupações por conta dos filhos e do trabalho na casa da Dona Mercês, que já estava bem velhinha e dependia dos seus cuidados.

Pois bem. Um dia os filhos anunciaram que iam moram em Salvador com o pai. Tinham uma boa proposta de emprego e tudo estava encaminhado por lá. O pai nunca dera pensão e seria uma grande oportunidade de ajudar. Além de tentarem uma reaproximação. Elza quase morreu de tanto chorar. As visitas de Josefa e Luiz passaram a ser quase que diárias. Não entendia a escolha dos filhos. Ainda mais morar com o pai, que nunca fora lá grandes coisas. Ela que tanto dedicou a vida por eles. Era injusto demais.

Para piorar a situação que não estava nem um pouco boa, Dona Mercês morreu. Seu mundo definitivamente não tinha mais valor. Ela perdera tudo de uma vez só. Tudo que fazia algum sentido ou alguma ocupação. Muito complicado viver com o abandono e a morte. E agora o que seria sua vida? Quem sabe seria bom se preocupar com outras coisas? Ver outras ocupações? Reinventar a vida? Os amigos a questionavam. Mas Elza não respondia a qualquer estímulo.

Certo dia, já bem tarde, Elza passava pela pracinha de seu bairro. Viu uma luzinha acessa e muitas pessoas cantando. Sentiu certo conforto e resolveu aproximar. As pessoas fechavam os olhos e colocavam cuspes e orações pra fora, embalados numa música de fundo. Era a música que ouvira de mais longe. Ficou curiosa. Queria entender como funcionava aquele transe que seus olhos viam. Como as pessoas podiam fazer aquilo? Quem estava por trás disso? Elas vestiam o mesmo tipo de roupa. Uniformizadas e falando de um mesmo lugar. De outro mundo que não era o seu. Parecia ser melhor, bem melhor. Decidiu ficar. Ficou pra sempre.

- Bom dia meu irmãos. Eu sou a missionária Elza. Estou aqui para dar o meu testemunho. Antes eu era uma pessoa perdida, que não via sentido em nada. Hoje meu mundo tem cores de rosa, verde, amarelo. Antes tudo era escuridão e tristeza. Hoje moro neste mundo, onde a oração é minha principal arma e a ajuda pra tudo vem de cima e de mais ninguém. Aqui não existe guerra, fome, traição, pobreza, depressão, luxúria, pornografia. Por isso temos de contribuir para que este mundo cresça. Este mundo me salvou. E pode salvar você também. Glória!

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Sacada de mestre




A morte em si é ingênua. Na verdade o que nos faz sofrer são os andamentos de tudo.

Lá vem ela de novo. A falta do contato físico. O processo de aceitar que ela levou alguém. 

Não é má nem bruxa. Talvez seja aquela que equilibra, transforma, organiza.

A morte tem o dom de deixar algumas relações insignificantes. Quem nunca abraçou o inimigo depois de uma grande perda? Tudo é mesmo relativo. Não é hipocrisia. O ódio só é muito enquanto não há grandes perdas. É comum as coisas ficarem sem importância.

A morte organiza a atenção. Com o vazio ela mostra o quanto precisamos dos outros. O quanto cabe na nossa sala de estar, nos espaços em branco. E a gente encontra um, outro, mais outro. A vida tem nova redistribuição.

A morte não deixa buracos. Ela coloca obturações. Ninguém é mais o mesmo. Nenhuma ferida é mais a mesma. E como todo reparo é preciso cuidado.  

Também tem a hora de deixar a morte de lado. Cansa pensar nela. É bom falar das pessoas que se foram com mais alegria. E é lógico ter tempo para as piadas, situações engraçadas.

É a mais pura verdade dizer que a morte sempre vai representar o início. Não que eu a venere. Agora parece absurdo dizer isso, mas a morte carrega consigo uma sacada de mestre. 

segunda-feira, 25 de junho de 2012


Dos armários

Era final de expediente. O calor incomodava Ana apesar das parafernálias de ar condicionado, persianas inteligentes. Seria outro dia comum, não fosse sua necessidade repentina de abrir o armário. Ela não viu função para aquela bobagem de abrir um armário sem motivo algum. Quando o abria era para organizar os livros de um lado, as revistas de outro, os filmes daquele. Gostava de verificar a utilidade dos materiais, como se tornariam projetos ou novas ideias. Arquivo era tratado como coisa viva. Estava ali pra ser folheado. Pra indicar como proceder ou simplesmente não fazer. Tudo tinha um porquê. Mas agora não existia um motivo para levantar e puxar suas portas. Era hora de deixar o armário.

Daquele dia em diante aquele objeto quadrado tinha se transformado em armário. Peça de escritório. Quem olharia pra ele? Bom, as pessoas que gostam de armário, ela pensou. Ou quem percebesse que estava sujo, talvez. E as coisas, o monte de trem, a bagunça? É verdade. Estavam todos na posição da última mexida. Mas agora sem alma. Era mesmo gente que faltaria. Ana entendeu que mesmo que outras pessoas lhe dessem “vida”, nunca mais os objetos teriam o mesmo sentido.

E ela pensou que muitos armários viviam constantemente sem alma. Era desesperador. Pegou um dos trabalhos empilhados. Lembrou-se das horas empenhadas, stress, dor de barriga, náuseas, insônias e por fim o mérito. Teve a sensação que o papel esquentava na sua mão. Como se tivesse sangue circulando rapidamente nas páginas. Voltou com eles para o armário ajeitando-os como filhote no ninho. Como ficariam os projetos famintos? Quem os alimentaria? Ela dava comida, mesmo quando a dificuldade era grande. E agora?

Lembrou-se de uma velha amiga que lhe dizia sempre: “Ninguém é insubstituível”. A recordação lhe trouxe certo conforto. Em todo tempo é tempo de outras pessoas, de novos olhares, de outras dedicações. Fechou as portas daquele armário e com carinho deixou suas chaves à vista. Quem sabe a novidade seria mais rápida do ela estava imaginando...

sábado, 7 de janeiro de 2012

Pra não dizer que não falei de como me sinto



É hora de agir. Sabe que tem uma grande decisão pela frente. A barriga dói, ansiedade aumenta. Tenta ficar firme porque a escolha depende de você. O que o faz pensar que é necessário ficar calmo? A razão? Respirar lentamente e centrar na questão. Avaliar as possibilidades do sim e do não. Medo? Mais que comum. Liga pra alguém. Um amigo a quem confia seus segredos. O pai a lhe dar conselhos maduros. Alguém que viveu bons pedaços. Quer falar com sua avó. A experiência dela lhe traz a segurança de que certas decisões são necessárias. Escuta música. Liga para outro amigo. Talvez chore um pouco. É certo que a qualquer hora o tabuleiro vai se alterar. Come um doce. Dois. Três. Um pacote deles.


Senta num canto qualquer. Apega-se aos seus critérios de escolha. Eles passam pelas experiências concretas, pela moral e pelo senso humanista. Eles pautam suas decisões. Não há outros intermediários. Eles nunca existiram dentro de você. Um dia você tentou por pressões externas, comodidade, aceitação... Talvez. Mas não crê que alguém que nunca existiu pra você possa te ajudar. Não existe. Sem link e vias. Em determinada época você aceitou colarem em suas querências da mesma forma em que o homem de lata aceitou a figura do coração. Você colou e tentou acreditar. Não aconteceu o espaço. É muita força que se tem que fazer quando algo é figura sem sentido. O homem de lata acreditou no coração. Eu não acreditei no que tentei colar em mim.

A xícara de café bem quente sem açúcar. Gole e pensamento. Pausa. Outro gole já frio. Olha a chuva. Esquece-se da decisão. Enxerga que você é infinitamente pequeno diante de tantos problemas no universo. Seu problema fica menor. Bem menor. Você é um pontinho quase apagado. A barriga para de doer. Cessa a chuva e o sol brilha. Tudo queimando novamente. Nada muda porque você muda. Não é uma catástrofe. A ansiedade some. A fome aumenta. Tudo vivo dentro de você. Anima-se. Decide. Liga pra alguém. Quer comemorar a escolha.