Acho que matei as bruxas.
Quando era pequena, lembro do suor pingando no calor das cobertas. Rosto tapado, nem um buraquinho. Não podia deixar brecha para a perversa entrar no emaranhado de cabelos e panos.
Depois de anos decidi não acreditar mais nela. O medo, a falta de coragem de acender a luz, as visões da porta acabaram. Mas também desapareceu a conversa com os anjos e os possíveis espíritos. O outro lado sumiu. Vi explodir o sentimento de segurança em minhas escolhas. A coragem avançava. Bons dias foram aqueles...
Há momentos em que sinto raiva daquela decisão. Pra que espantar as bruxas? O mistério, as animações, a cortina das fadas, dos monstros me traziam certo conforto. A dor não caminhava tão dura. Havia sempre um pouco da lacuna preenchida por caldos mágicos.
Veio a dor dos amores. Aquela que enche os espaços de saudade. No lugar das fadas pousaram as explicações lúcidas. Os porquês das decisões. A lacuna traz agora um ar de maturidade ocupada pela razão dos 30 e poucos.
Ontem fechei todas as frestas da cortina. Apaguei a luz e saltei na cama simulando medo. Entrei no meu casulo. Cinco minutos e abri tudo. Esbaforida pela falta de ar debaixo das cobertas. Já rompi com isso. Ri de mim mesma.