terça-feira, 21 de agosto de 2012

Sacada de mestre




A morte em si é ingênua. Na verdade o que nos faz sofrer são os andamentos de tudo.

Lá vem ela de novo. A falta do contato físico. O processo de aceitar que ela levou alguém. 

Não é má nem bruxa. Talvez seja aquela que equilibra, transforma, organiza.

A morte tem o dom de deixar algumas relações insignificantes. Quem nunca abraçou o inimigo depois de uma grande perda? Tudo é mesmo relativo. Não é hipocrisia. O ódio só é muito enquanto não há grandes perdas. É comum as coisas ficarem sem importância.

A morte organiza a atenção. Com o vazio ela mostra o quanto precisamos dos outros. O quanto cabe na nossa sala de estar, nos espaços em branco. E a gente encontra um, outro, mais outro. A vida tem nova redistribuição.

A morte não deixa buracos. Ela coloca obturações. Ninguém é mais o mesmo. Nenhuma ferida é mais a mesma. E como todo reparo é preciso cuidado.  

Também tem a hora de deixar a morte de lado. Cansa pensar nela. É bom falar das pessoas que se foram com mais alegria. E é lógico ter tempo para as piadas, situações engraçadas.

É a mais pura verdade dizer que a morte sempre vai representar o início. Não que eu a venere. Agora parece absurdo dizer isso, mas a morte carrega consigo uma sacada de mestre.