sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Uma vida cheia de fantasmas



Todos os dias eles estão na minha casa. Entram e saem na verdade. Beijam às vezes meu rosto. Tomam café comigo. Quando assusto estão no quintal, colhendo goiabas, fazendo tachadas de doces. Brindam em nossas festas, sentam ao nosso lado, ouvem histórias e riem junto com a gente. Até mesmo de seus deslizes, erros, exageros.  Há dias em que voltam a ser crianças levadas da breca. Chutando a canela dos adultos, matando formigas pra fazer experiência, e querendo a atenção de quem estiver por perto. Em outro tempo já se apresentam como adultos debochados e cheios de manias.  Mas são nos dias de seus aniversários e nos feriados que passam mais tempo com a gente. Já começam cedo a lavar a área da churrasqueira, arrumar a casa, mexer a comida e até a arriscar palpites. “Se fosse eu colocaria mais pimenta, menos sal, deixava a massa mais tempo descansando”.

Debochados, bravos, sinceros, chatos e de um amor sem tamanho. São assim nossos fantasmas. Estão sempre com a gente. Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, na pobreza e na riqueza. Amém. Qual o motivo então de existir um dia para nos forçar a ser tristes? A reconstruir na memória todos os trajetos de certos dias fatídicos? Se a razão for ter um momento pra rezar, orar, meditar, pedir, energizar por eles, que sejam todos os dias. Que sejam incluídos em nossas vidas. Na verdade eles estão. Tudo é rito mesmo. Importante pra uns, sem motivo pra outros.

Bobagem pra mim. Os meus fantasmas já comem da minha comida diariamente. Eles estão aqui e ali, em cada pensamento, ato e palavras soltas. Durante todos os dias da minha vida até que a morte nos separe (ou, segundo alguns que dizem saber, nos encontre).