quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Incuráveis

- Tem muito tempo que não encontramos! Por que está com a expressão de cansada? Aconteceu alguma coisa?
- Uai, tô? Não... Acordei muito cedo deve ser isso. Tem tempão mesmo. Desde aquele dia fatídico.
- A festa de casamento da Lurdinha. Mas foi tão chique, dançamos pra caramba! Lembra?
- Lembro...
- Então, me diga. Que mal há nisso?
- Pra você nenhum. Mas eu não gostei de me expor daquela maneira. Mostrar pras pessoas que gosto de dançar daquele jeito.
- Dançar é dançar, que bobagem!
- Exibi demais. Não acho que minha imagem ficou legal.
- Conversei com muita gente nas semanas seguintes à festa. Não falaram nada sobre você. Ah, mentira! O Eduardo, o Francis e a Magda disseram que você vive mergulhada em um vidro de formol!
- Viu só! Tanto me expus que notaram em mim! Eu sabia!
- Clara, tem quase um ano que o casamento aconteceu e você ainda se martiriza com esse pensamento? As pessoas já esqueceram. Quer dizer, se é que tinham algo pra esquecer!
- Carmem, você é sempre assim. Coloca panos quentes em tudo. Não quer falar sobre o que aconteceu, a verdade das coisas.
- Qual verdade Clara? Acha que minto, é isso?
- Acredito que enxerga a vida muito cor de rosa.
- E não é bom?
- Talvez seja. Em certos momentos... Mas o tempo todo Carmem! Não gosto do exagero.
- Não vejo dessa forma. Isso que está me pedindo é o mesmo que dizer “pega tudo que já aconteceu na sua vida e martirize os momentos ruins”.
- Nada disso. Estou pedindo “pegue tudo na sua vida e não se esqueça de refletir sobre os momentos ruins, não seja inconseqüente”.
- Prefiro lembrar o vestido da Lurdinha, das taças de espumante que bebi, das músicas que dançamos...
- Ai ai ai! Das músicas! Você também não se esquece dessa hora, de como eu estava exaltada! Viu só?
- Clara, pelo amor de Deus! Não lembro a roupa que você usava! Muito menos se o jeito de dançar estava extravagante!
- Ah, Carmem! Você se lembra sim. Em hora alguma mencionei a palavra extravagante. Falou, então estava no seu subconsciente.
- Melhor paramos a conversa por aqui.
- Também acho.
- Não gostaria de achar que pensa que sou uma lunática.
- Não falei isso! Você gosta de florear as coisas, é diferente.
- Evito é interpretar uma situação de forma tão dura. É verdade que gosto de ser romântica sonhadora. Isso não me impede de ser realista.
- Acho difícil.
- Tudo bem Clara. Mas como ficamos então? Tenho que ir... O que vamos guardar deste encontro?
- Eu vou guardar que estamos vivendo caminhos bem diferentes. E talvez não seremos tão amigas.
- É... Seu ponto de vista. Clarinha, eu vou guardar que nunca vi olhos mais lindos que esses seus. E que falamos sobre a vida.
- Incurável!
- Incuráveis, Clarinha, incuráveis!